O encontro entre Mariana e Pedro estava
escrito nas estrelas, mesmo assim o amor não desabrochou: Mariana sorria quando
pensava no rapaz, mas todas as vezes em que surgia uma oportunidade de falar
sobre seus sentimentos, a tela do smartphone de Pedro se acendia e ela se
convencia de que não teria nenhuma chance contra a dona das mensagens enviadas a ele. Pedro
tinha pouco controle sobre a vontade de estar perto de Mariana. Sempre encontrava
desculpas criativas para conseguir algumas horas de conversa e novas chances de
encontrar aqueles encantadores olhos cor de mel, mas Mariana não correspondia
seus sentimentos; uma hora ela parecia prestes a dizer o que ele tanto
esperava ouvir e no minuto seguinte recuava como se simplesmente tivesse mudado
de ideia. Apesar de suas várias tentativas, os encontros terminavam apenas com um
beijo no rosto, um abraço e um “boa noite” sussurrado ao pé do ouvido. Com o
tempo Mariana passou a declinar dos convites de Pedro e ele decidiu que talvez
devesse se render à insistência daquelas mensagens que inundavam seu telefone
muito mais vezes por dia do que ele gostaria de receber.
João e Luísa tinham se apaixonado
à primeira vista, mas a coisa toda nunca passou de alguns beijos quentes, uma
noite entre lençóis e promessas de um segundo encontro. Eles descobriram muitas
coisas em comum enquanto bebiam cerveja barata e desfrutavam da reserva de seis
horas do motel no centro da cidade: amavam a natureza, odiavam os empregos, sonhavam
com uma viagem ao redor do mundo e com um labrador no quintal de casa. Trocaram
contatos, mas Pedro nunca chegou a enviar o convite de amizade para o Facebook de Luísa:
ele achou que viu festas, bebidas e homens demais nas fotos compartilhadas por
ela na rede social e decidiu que não queria ser apenas mais um nome em uma extensa lista de contatos. Luísa esperou por um telefonema, uma mensagem ou um convite em suas redes sociais, mas não ficou realmente surpresa quando nada aconteceu; as amigas
não se cansavam de lembrar que ela nunca deveria se apegar a casos de uma noite. Poucos dias depois já não houve mais espera, nem recordações sobre a viagem de mochilão que havia
sido combinada entre beijos quentes e suspiros de prazer.
Claudia amava Carlos e tinha
certeza de que eles seriam felizes para sempre, até o dia em que ela abriu sua
conta no Instagram. Descobriu que Carlos tinha uma quantidade desnecessária de mulheres
como seguidoras e que uma delas curtia apenas as fotos em que ele aparecia
sozinho. Carlos dizia que ela estava fazendo tempestade em um copo d´água, mas Claudia
começou a desconfiar que talvez estivesse confiando demais nele. Houve discussões
e mais suspeitas, até que um bate boca virtual com a seguidora assanhada levou
ao chão os alicerces fragilizados do relacionamento. Carlos terminou o namoro
afirmando que precisava de uma mulher mais equilibrada e Claudia concluiu que o ex-namorado era o maior cafajeste que já havia caminhado sobre a face da terra.
As histórias de amor fracassadas se
multiplicavam a uma velocidade alarmante e pesavam sobre os ombros dos pobres anjos
Cupido como um fardo desconfortável. Havia aqueles que achavam que a mira deles
já não andava tão boa e outros que tinham certeza de que o problema estava nas
flechas. Havia, ainda, os que achavam que o contingente dos Cupidos tinha sido reduzido,
talvez mobilizado para atender outros tipos de problemas celestiais de nível
mais elevado. Mas a verdade era que estavam todos enganados: os Cupidos vinham
trabalhando mais do que nunca, sua mira permanecia impecável e as flechas eram
tão boas como antigamente.
A crise dos Cupidos já havia sido
reportada para os anjos Serafim, que prometeram subir o problema para o último
nível. A sabedoria dos anjos Querubim também havia sido requisitada para ajudar
a lidar com aquela turbulência, mas a busca de uma solução vinha se mostrando uma
tarefa muito complexa e não havia previsão para melhora no cenário a curto prazo.
Enquanto as respostas não vinham, os Cupidos continuavam vagando sem descanso
pelo mundo, atirando suas flechas e torcendo para que elas passassem através dos
retângulos metálicos que os seres humanos mantinham erguidos quase vinte e
quatro horas por dia na altura de seus corações.
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